Pena.

O papá ficou mal outra vez, com muitas dores nas costas. Já há algum tempo (meses). Depois melhorou e depois, um quase insignificante incidente, em auxílio num parque de brincadeiras, esmagou o peito contra uma barra metálica e ficou novamente mal.
O novamente mal, é novamente não conseguir dormir descansado, é deixar de espirrar, é gemer com dor enquanto dorme (o pouco tempo que consegue permanecer deitado na cama).
Ontem ao vêr o vosso pai a trabalhar já depois da meia noite ao computador, fiquei com pena dele. Pena. Pelo sacrifício que faz, porque se não consegue dormir com dores, vai escavar para a horta. Porque come todos os restos do frigorífico ao almoço no trabalho para poupar. Porque não manda arranjar umas botas e não compra outro par porque precisa, para não gastar.
Senti pena do pai. E senti-me mal comigo mesma. Não trabalho, não trago dinheiro para casa. A nossa opção foi a mãe ficar em casa, não pagando a vossa escola, e assim, não dar despesa com combustível e almoços (que por muito que se tente, é dificil rejeitar sempre, por motivos de dinheiro, ir almoçar fora com os colegas que vão em grupo).
Há dias em que penso que gostava mesmo de ganhar algum dinheiro para que ele não faça tanto sacrifício. Para que não se sinta miserável. Para que se sinta mais liberto. E penso que se eu estivesse a trabalhar, o sufoco talvez não passasse pelo aperto económico, mas sim com o aperto da logística, da negligência em relação a vocês (porque no trabalho que tinha, entrava cedo e saía tarde, não era trabalho que se fizesse em casa, mas sim presencialmente, e sendo no centro de Lisboa, e não podendo escolher o horário, sei que não iria nunca conseguir por-vos na escola nem apanhar-vos, a não ser que fossem os primeiros a entrar e os últimos a sair). Tudo isto iria cair para cima do mesmo: o pai, que teria de ter sempre disponibilidade, e eu, seria só mais uma pessoa do agregado a não estar com vocês.
Sinto que vos tive como uma missão. Estava definido que assim seria (Violeta, és a prova de que tudo estava escrito para ser romanticamente assim! minha ursinha pequenina...). Só eu sei a dor que sinto quando relembro episódios específicos em que falhei com a Iara, em como falhava diariamente com a Iara, em como falhei com o Eduardo nesse tempo em que trabalhava e tinha a Iara.
O meu despedimento foi consensual (acho eu) e sinto que é o melhor para vocês os três: dou apoio escolar à Iara, dou casa à Iara (que não teria se tivesse ATL) e dou atenção ao Bernardo e à Violeta, dando-lhes tempo de crescer e entrar no rame-rame mais tarde, quando não for já opcional. A vida stressante de pressão matinal, o despachar com pressa, o viver com pressa desde que acordam até que se deitam não é uma ideia que se faça ter vontade de também eu voltar a essa vida.
Não sei se me estou a conseguir fazer entender.
Também tento não gastar em coisas desnecessárias, mas o ver o pai às vezes tão mergulhado e triste, entristece-me. Mas continuo a obrigar-me a acreditar, que a opção que se fez é mais rica para todos, do que as moedas na carteira.
O que estou a receber de vocês, notas na conta não pagam. O mesmo dirá o pai (acho) porque se estivessem na escola não seriam como são hoje (acho).
Neste momento estou a ter dificuldade em manobrar o Bernardo (a idade assim o impõe) e tenho a Violeta constantemente em cima do meu cólo.
Tudo passa e muda, a vida está sempre a mudar.
Não tarda vocês já estão na primária, e a nossa vida bem diferente. E eu com saudades dos tempos em que a Vi só respirava a mãe, em que o Bernardo me dava beijinhos à esquimó, e que a Iara estava em casa às 13h10 só para mim.
Amo muito vocês os quatro. Vocês são sem dúvida nenhuma, o que mais me torna sensível, me enfraquece, e me fortalece.

Que o problema do pai seja temporário, que fique bem, que ganhe saúde e relaxamento. Que fique mais gordo e feliz com essa opção. Que fique mais desafogado. Torço para que a cenoura caia em breve, só para o descansar a ele. Que durma descansado. Que tenha o que merece.
Que o tempo páre, por favor.
Obrigada pai, por me dares estes filhos e a oportunidade de os respirar...

Da mãe.

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