O urso P. é de ouro

O urso P. é o melhor pai do mundo. Rezingão, exigente, abrutalhado nas palavras, mas ainda assim o pai mais preocupado, participativo, amigo e com braços e mãos do tamanho do mundo.

O urso P. pega em nós com mestria, não deixando nenhum cair. O urso P. esteve um ano mal. De sofrimento intenso diário, não nos negando a sua presença diária, nem resfriando a sua energia, nunca deixou de estar connosco, por medo de falhar, por medo do que não se sabia se iria correr bem ou mal.

O urso P. é o homem mais altruísta, bondoso e forte que vocês conhecem, e nunca, nunca conhecerão homem mais forte que ele. Não haverá homem algum que resista tanto tempo à dor, sem refilar, sem se desmoronar, sem socar médicos incompetentes, sem escrever reclamações.

O urso P. que pouca paciência tem, teve paciência todos os dias dum ano, e no final, ainda se sentiu grato por isso.

O urso P. com dores incessantes, trabalhou todos os dias, de corpo e mente, de forma intensa e produtiva, em dose redobrada, por não saber o que iria acontecer.

O urso P. conteve muita dor, guardou muito sofrimento só para si, escondeu sentimentos que iriam desmoronar a mãe.

A ursa M. teve a vida facilitada, porque  o pai nunca foi abaixo, e porque não podia dar parte fraca ao elemento supostamente fraco do momento (um ano).

A ursa M. é chorona, e pouco chorou neste ano, tentando não pensar no horror que o pai estava a passar, graças aos sorrisos dos três ursinhos.

A mãe teve muito medo, mas não fixou datas, não memorizou acontecimentos, cada consulta. O Pai fixou as datas, e revive-as decerto, intensamente. E sofre em cada memória.

No acidente de mota, as dores tinham sido causadas por algo visível, e por isso reconhecível por todos e qualquer um. As dores posteriores e com causa mistério, não eram justificadas por nada, nem reconhecidas pelos do meio do pai, como as do acidente. Nunca ninguém saberá o sofrimento que o nosso urso passou. Nem eu sei o que ele passou na realidade. Eu tento adivinhar, e esse adivinhar, adivinha um horror. Ele não parou, não teve pausas, não teve descansos, não teve desculpas.

E eu peço desculpa ao urso P. se estive aquém todo esse tempo. Se não lidei bem, se apoiei pouco, se chateei demais. Se não ganhei dinheiro nesse tempo para poder ser ele a estar em casa de repouso. Não sei. Não sei tanta coisa, não sei o que ele esperava da ursa M. e tenho medo de ter feito algo fortemente errado, e quando penso nisto, sinto medo, de ter falhado fortemente.

Quero tanto que ele seja feliz, limpo, sem a malícia do bixo, e queria muito, muito, muito que todo aquele ano de dor, se apagasse.

A ursa V. como já escrevi antes, foi o motivo, julgo eu, por não irmos abaixo. Eu tive medos, que de tão assustadores que eram, me obrigava a não imaginar, a não pensar, a não chorar. Quanto mais escrevo mais revoltada fico.

Sei que devo sentir gratidão, mas mais que isso, sinto raiva por o urso P. ter sido forçado a ser submetido a tanta dor.

Nós estamos mal e vamos ao hospital, aguardando o alívio da dor a curto prazo. O pai aguentou dor intensa um ano.

Um ano é só o que fica na cabeça.

A espera da saída do bloco, sentada sozinha no chão do hospital depois de falar com o médico que me assustou porque o pai ficava 8 semanas internado.

Tenho medo de vos perder, a cada um de vocês, não pensando no assunto. Boas energias, bons pensamentos. Equilíbrio.

Mas pensei um dia, que realmente ficaríamos só os 4, durante 10 segundos. E apaguei esse pensamento, que me deu vómitos instantâneos. Se temos a capacidade de afastar certos pensamentos? temos. Eu tive. Porque sempre soube que o urso P. ia ficar bem. O pior, é que enquanto eu sabia que ele ia ficar bem, ele não estava bem. E queria muito, muito, muito, que nós conseguíssemos fazer o pai feliz, porque o urso P. merece. Merece uma vida longa e feliz. E saudável. E feliz outra vez.

Amo muito o urso P. Não quero viver sem o urso P. E há muito combinámos que a mãe é a primeira a partir.

Amo-vos muito, e espero que cada um dos meus ursinhos encontre um amor forte como o dos vossos pais... E que os pais estejam sempre com vocês, que não vos falhem.

Caralho das lágrimas. É acabar com isto e ir dormir.

A ursa M.
A mãe.

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